Tudo me parecia cinza, esparso e também estranho. E o mesmo acontecia com os dias, com as músicas, com a sua face iluminada em um filme noir clássico e impecável. Também as estrelas, o céu sufocante e infinito, o amor que nos aprisiona debaixo das principais constelações, anjos e Beethoven à parte.
Eu via tudo isso e tudo isso me parecia cinza, eu pensava, isso também está dentro de mim, enquanto eu caminho soturno pelos bares e avenidas, respiro, transbordo cambaleante pela superficialidade das coisas.

quinta-feira, novembro 10

Nossas angústias de Hollywood

A verdade Bárbara é que às vezes o papel é pouco. Eu sei que eu sou um pouco exigente com as pessoas, com a verdade, com a minha patologia, com o meu amor que é meio controlador e cheio de rédeas. Eu sei também que eu sou egoísta e mesquinha, pensando sempre em mim, no meu escudo, nas minhas vontades cheias de quero-quero e bato-o-pé.

A  verdade é que eu sou exigente com tudo e escrever às vezes não adianta. Também não funciona, também não tira o nó do peito, também não cura a vontade de me entregar, de dormir um sono eterno ou me atirar do vigésimo quinto andar só porque o filme é de drama e hoje é domingo de noite.
Bárbara, a questão é que nunca vai ser suficiente. Eu, você, ela e seu amor. Mesmo que seja assim: intenso e quente feito seus cigarros doces Hollywood.

A gente chora dentro de um abraço às oito da manhã e finge sorriso, esquece tudo. Você paquera qualquer distração ao meio dia em um bar decadente perto da facul.
E eu fico assim, só de longe, me sentindo muito pequena,  porque eu tenho medo.
Eu sei que eu sou medrosa pra caralho e exagero quase sempre. Mas é que as vezes, Bárbara assistir dói. É como eu te disse, ainda nesta tarde, nas nossas conversas de rasgar o peito: eu só posso assistir.

A vida assim é meio boca livre, meio torta, uma putaria sem fim de esconde-esconde, dramas familiares e preconceitos invejosos. Porque no fim, nem todo mundo sabe amar.
E você sabe. Teve esse puto azar de nascer em um janeiro de capricornio. De se entregar, de não ter minhas rédeas, de se jogar de penhascos. E eu só consigo pensar, que medo. Que medo filha-da-puta por você.

Seu amor, eu imagino, deve morar na zona sul da capital. E você tem que enganar a vida pelas esquinas de um bar ou de uma festa de fim de semana. Só porque a história tem seus horários, só porque a porra da mamãe deve ser ariana e controladora como eu. Só porque o mundo ainda não está preparado para o tanto de intensidade que você nasceu para dar.

Minha Bárbara, o papel continua pouco e as palavras pequenas. Pequenas perto de toda aquela energia e proteção que você merecia - merece - e que eu quero te dar.
Como a gente é limitado e fraco, Bárbara. Como somos pequenos.

De onde é que a gente tira força e consegue escolher os caminhos, a desatar os nós, a enfrentar os pais, a fazer as malas, a dizer adeus, a brigar pelo destino, a enfrentar pelo amor?
Quando e com que idade eu ou você pegamos o lápis, sangramos pelos dedos, cuspimos diante de tanta hipocrisia, tanta crueldade, tanta caretice, meu Deus.
Como é que a gente foge disso tudo e encontra Paris no meio dessa cidade maluca de sol-chuva, e que tem mais de um milhão de habitantes e ainda assim, todo mundo se conhece?
Como é que a gente se esconde? Como é que a gente chora sem ter medo de ser interrogado? Como é que se marca na pele as cicatrizes, os dias de glória se nos apontam os dedos todas as vezes que a gente promete ser feliz?

Eu também não sei. Meu peito canta azul de assistir essas dores de parto, de ausências, de amores predestinados e de gente horrível que não sabe fazer poesia de amor. Não aprenderam a chorar na vida, no mínimo.

Só sei que um dia a gente descobre. Ou encontra as chaves. Repito que eu não sei. Mas você, eu desconfio que acaba se jogando do meu vigésimo quinto andar: não porque é domingo, o filme é triste ou você não suporta a dor.
Eu suspeito que você já nasceu sabendo voar.

Meu ombro, meu lamento e meu amor eterno, de sempre.

3 comentários:

  1. Muito bom seu blog.. Adorei!!

    Seguindo vc aqui, segue de volta??
    http://belezaeatragedia.blogspot.com

    ... bjos, Até Mais!!

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  2. OCASO
    Ai!
    mas tenho medo do tempo
    sobre teus dias
    pesando-os fatais

    pesando-os
    lembrete tenaz do


    e s q u e c i m e n t o

    Ai!
    e acompanhando teus sóis
    tenho medo de esvair-me noite

    acaso
    o caso
    ocasione

    Ai!
    tenho medo do tempo sob teus pés
    pegadas só vão

    temo
    uma noite que não sei

    acaso
    o caso
    ocasione

    e de repente
    sen ti:

    Ai!
    temo tudo

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