Tudo me parecia cinza, esparso e também estranho. E o mesmo acontecia com os dias, com as músicas, com a sua face iluminada em um filme noir clássico e impecável. Também as estrelas, o céu sufocante e infinito, o amor que nos aprisiona debaixo das principais constelações, anjos e Beethoven à parte.
Eu via tudo isso e tudo isso me parecia cinza, eu pensava, isso também está dentro de mim, enquanto eu caminho soturno pelos bares e avenidas, respiro, transbordo cambaleante pela superficialidade das coisas.

terça-feira, novembro 8

Scarlett

Enquanto ele se aproximava e segurava meu ombro esquerdo de um jeito terno, querendo me acalmar, eu só conseguia imaginar como sair ilesa, qual a forma mais bonita de se recusar um beijo e se há formas bonitas de se fazer isso. Ele se aproximava e eu agora, só conseguia pensar no quanto eu me desequilibro tentando manter o passo no meio fio, no quanto eu caio e sou frágil.

Ele abre a boca e fecha os olhos. Nessa sequência. Encosta o rosto no meu e eu penso em abismos, em corredores, em filmes de ação, no quanto eu sonhei com ele e com seus beijos. E como ele pode me fazer feliz. Ele pode. E quanto mais penso nessas certezas, mas eu tento imaginar se há, de fato, formas bonitas de dizer não.

Mas eu tentava também, ao mesmo tempo, não prestar atenção em tudo que eu pensava. Eu dizia baixinho, sussurrando para dentro:

- Deixa beijar, Scarlett. Deixa beijar

(...) continua

3 comentários:

  1. o melhor
    “não”:
    reptício

    podar
    o menos
    estético do “não”,
    torneá-lo em
    pedra sabão - face de um santo

    deixá-lo pousar
    em sua mão
    pássaro diáfano
    e voar de iluminado

    o “não”
    que me apague ou
    fantasie
    leve / leve-me

    enquanto
    o sim
    poente

    na sombra do
    não
    morro

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