tag:blogger.com,1999:blog-38335726051702447812024-03-12T17:47:48.343-07:00 Nunca mais amorAna Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.comBlogger80125tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-54380586661096367322013-01-07T14:25:00.001-08:002013-01-07T14:31:16.840-08:00<br />
<div align="justify" style="background-color: white;">
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;">Vês! Ninguém assistiu ao formidável enterro de tua última quimera.<br />Somente a ingratidão - esta pantera - foi tua companheira inseparável!</span></div>
<div align="justify" style="background-color: white;">
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;"><br /></span></div>
<div align="justify" style="background-color: white;">
<span style="font-family: Verdana, sans-serif;">Toma um fósforo. Acende teu cigarro! O beijo, amigo, é a véspera do escarro, a mão que afaga é a mesma que apedreja.<br />Se a alguém causa inda pena a tua chaga, apedreja essa mão vil que te afaga, escarra nessa boca que te beija!</span></div>
<div align="justify" style="background-color: white;">
<span style="font-family: Verdana; font-size: x-small;"><br /></span></div>
<div align="justify" style="background-color: white;">
<span style="font-family: Verdana; font-size: x-small;"><br /></span></div>
Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-76736538718014290312012-08-23T07:49:00.002-07:002012-08-23T07:53:22.094-07:00<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="http://4.bp.blogspot.com/-F5tnrEldPl8/UDZDAHjGXkI/AAAAAAAAAN8/3mPruQ3fgyc/s1600/gustav_klimt_danae_1907-8.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="612" src="http://4.bp.blogspot.com/-F5tnrEldPl8/UDZDAHjGXkI/AAAAAAAAAN8/3mPruQ3fgyc/s640/gustav_klimt_danae_1907-8.jpg" width="640" /></a></div><br />
Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-5613725398014067802012-08-03T07:45:00.001-07:002012-08-03T07:45:28.296-07:00<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="http://2.bp.blogspot.com/-0AxsHG7C5sQ/UBvj_qP3fXI/AAAAAAAAANo/uHVxqQBCjTk/s1600/tumblr_m3dgf9kxCM1qzlfavo1_500_large.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="640" src="http://2.bp.blogspot.com/-0AxsHG7C5sQ/UBvj_qP3fXI/AAAAAAAAANo/uHVxqQBCjTk/s640/tumblr_m3dgf9kxCM1qzlfavo1_500_large.jpg" width="640" /></a></div>Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-1024393091416855122012-08-03T07:40:00.002-07:002012-08-03T07:40:56.152-07:00Lembra-te de teus amores. Lembra-te, que é tua vez<div style="background-color: #fcfcfc; color: #090808; font-family: Verdana, Geneva, Tahoma, sans-serif; font-size: 14px; text-align: justify;">Hey baby, se você estivesse aqui agora, eu te mostraria em replays perversos como em uma comédia muda, preta no branco, um mundo irreconhecível. Um mundo do qual nunca iremos pertencer, eu suponho.<br />
Algumas coisas permanecem as mesmas, eu quero dizer, o sol, o mar, um dia na praia à revelia de tudo. Ainda não acordo cedo e nem retorno telefonemas. São segredos meus que confesso à você como quem confessa que eu, possivelmente, nunca tomarei responsabilidades na vida e “tudo bem, estou bem assim.” Não quero ir à analises ou ficar curada das obsessões que me perseguem o dia todo. E por tabela, como quem derruba a cada semicerrar de olhos os blocos alinhados em um espiral de encruzilhadas: particularmente deleito-me na cama à base de calmantes e sou muito feliz assim, triste e banida da humanidade que me encanta. </div><div style="background-color: #fcfcfc; color: #090808; font-family: Verdana, Geneva, Tahoma, sans-serif; font-size: 14px; text-align: justify;">Continuo me afastando dos bancos, das filas, das pessoas que me assustam por nunca ter ouvido suas vozes ou suas histórias. Penso muitas vezes “São todos fantoches colocados por Deus quando saio nas ruas. Cada qual interpretando seus papéis diante da vida que apenas acontece ao meu lado.” Não correspondo a mesquinharia dos solitários como te pareço assim: nua e dissimulada. É que a vida desde cedo sempre me pareceu individualista por si só. </div><div style="background-color: #fcfcfc; color: #090808; font-family: Verdana, Geneva, Tahoma, sans-serif; font-size: 14px; text-align: justify;">As conversas já não me interessam, <em>moun amour</em>, as putas ainda são putas e os vagabundos como eu continuarão vagabundos. Fumando seus cigarros à beira de um quadro do céu, assinado por Renoir. Por outro lado, seu mapa astrológico pairando sobre seus cílios de vidente (errante) me transformaram por inteira.</div><div style="background-color: #fcfcfc; color: #090808; font-family: Verdana, Geneva, Tahoma, sans-serif; font-size: 14px; text-align: justify;">Eu ardo, mas estou calma. Permaneço muda, estática, faminta sobretudo por coisas que ainda não descrevi ou interpretei. O mundo, como vinha lhe dizendo, eu não mais compreendo. Tomou proporções descomunais em línguas que eu ainda desconheço.<br />
Depois da escola, do intervalo das classes, eu chorava querendo que me servisse esta sina de escrever. Depois disso, muitos outros livros, minha mãe se despedaçando pelo espelho do banheiro e logo depois o meu rosto que envelhecia ao seu lado absorvendo suas dores em forma de neuroses que me perseguiriam para sempre. Foi quando eu descobri que também sofria das mesmas dores universais. Outro fantoche de Deus, eu penso agora.</div><div style="background-color: #fcfcfc; color: #090808; font-family: Verdana, Geneva, Tahoma, sans-serif; font-size: 14px; text-align: justify;">Por consequência ou desmazelo depois de conhecer você, não houve nenhum outro assunto no mundo sobre o qual eu desejasse escrever. Percebi também que nada soava tão bonito ou tão verdadeiro como quando eu detalhava o seu jeito de acender o cigarro ou o soco na minha cara quando eu insistia em questionar o meu talento. Ou como cantava alto, fazia piadas interessantes e inteligentes, como balançava despreocupado na rede estendida pela varanda. Não havia mais nada no mundo a não ser a varanda, a rede, a ilha que nos esconde entre sombras. Nada como o beijo trocado no escuro dos olhos fechados, mil estrelas enquanto forçava os olhos, tentando me segurar nas beiradas de meus sonhos nítidos.</div><div style="background-color: #fcfcfc; color: #090808; font-family: Verdana, Geneva, Tahoma, sans-serif; font-size: 14px; text-align: justify;">Você abre a porta.</div><div style="background-color: #fcfcfc; color: #090808; font-family: Verdana, Geneva, Tahoma, sans-serif; font-size: 14px; text-align: justify;">- Amor, entre o abrir e o fechar dessa porta eu espero o seu retorno. Enquanto isso, escrevo sobre você. E sobre tudo isso. </div><div style="background-color: #fcfcfc; color: #090808; font-family: Verdana, Geneva, Tahoma, sans-serif; font-size: 14px; text-align: justify;"><br />
</div><div style="background-color: #fcfcfc; color: #090808; font-family: Verdana, Geneva, Tahoma, sans-serif; font-size: 14px; text-align: justify;">(…)</div>Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-76297594958720759492012-07-15T15:17:00.005-07:002012-07-15T15:21:52.738-07:00<div style="background-color: white;"><br />
Mudei a máquina de escrever para o aposento ao lado onde posso ver-me no espelho enquanto escrevo. Tânia é como Irene. Espera cartas gordas. Mas existe outra Tânia, uma Tânia semelhante a uma grande semente, que espalha pólen por toda parte -- ou, digamos, um pouco de Tolstói, uma cena de estábulo na qual o feto é desenterrado. Tânia é uma febre também -- les voies urinaires, Café de la Liberté, Place des Vosges, gravatas brilhantes no Boulevard de Montparnasse, banheiros escuros, Porto Sec, cigarros Abdullah, sonata patética em adágio, amplificadores auditivos, sessões de anedotas, peitos castanho-avermelhados queimados, ligas pesadas, que horas são, faisões dourados recheados com castanhas, dedos de tafetá, crepúsculos vaporosos transformando-se em azinheiras, acromegalia, câncer e delírio, véus quentes, fichas de pôquer, tapetes de sangue e coxas macias. Tânia diz para que todos ouçam: 'Eu o amo!' E, enquanto Bóris se queima com uísque, ela diz: 'Sente-se aqui! Ó Bóris... Rússia... que farei? Estou estourando!'<br />
À noite, quando olho o cavanhaque de Bóris estendido sobre o travesseiro, fico histérico.<br />
Ó Tânia, onde estão agora aquela sua boceta quente, aquelas ligas gordas e pesadas, aquelas coxas macias e arredondadas? Em meu membro há um osso de quinze centímetros de comprimento. Tânia, alisarei todas as pregas de sua vulva, cheia de semente. Mandá-la-ei de volta para seu Sylvester com a barriga doendo e o útero virado. Seu Sylvester! Sim, ele sabe acender um fogo, mas eu sei inflamar uma vagina. Enfiarei pregos quentes em você, Tânia. Deixarei seus ovários incandescentes. Seu Sylvester agora está um pouco ciumento? Ele sente alguma coisa, não sente? Sente os remanescentes de meu grande membro. Deixei as margens um pouco mais largas. Alisei as pregas. Depois de mim, você pode receber garanhões, touros, carneiros, cisnes e São Bernardos. Pode enfiar pelo reto sapos, morcegos, lagartos. Você pode defecar arpejos ou amarrar uma cítara sobre o umbigo. Eu estou fodendo, Tânia, para que você fique fornicada. E se tem medo de ser fornicada em público, eu fornicarei privativamente. Arrancarei alguns pêlos de sua vulva e os grudarei no queixo de Bóris. Morderei seu clitóris e cuspirei moedas de dois francos..."<br />
</div>Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-82611751858006735052012-07-07T15:45:00.003-07:002012-07-07T15:45:25.715-07:00<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="http://1.bp.blogspot.com/-J9EGKrDEye4/T_i7-a-xwbI/AAAAAAAAANI/fS7-cBhblyY/s1600/1234121175647_f.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="640" src="http://1.bp.blogspot.com/-J9EGKrDEye4/T_i7-a-xwbI/AAAAAAAAANI/fS7-cBhblyY/s640/1234121175647_f.jpg" width="605" /></a></div>Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-79749560061723337092012-07-07T15:44:00.002-07:002012-07-07T15:44:40.008-07:00<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="http://3.bp.blogspot.com/-Hf03V6DRFmg/T_i7x2TkyhI/AAAAAAAAANA/fKmxX2Sqsg4/s1600/tumblr_m6dsi7LrVM1qa3j35o1_500.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="503" src="http://3.bp.blogspot.com/-Hf03V6DRFmg/T_i7x2TkyhI/AAAAAAAAANA/fKmxX2Sqsg4/s640/tumblr_m6dsi7LrVM1qa3j35o1_500.jpg" width="640" /></a></div>Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-7439641490857023932012-07-07T15:32:00.002-07:002012-07-07T15:36:20.429-07:00Quando eu te contei sobre os segredos da juventude<div style="text-align: center;"><div style="text-align: left;">(e o primeiro ou único amor a que temos direito)</div></div><div style="text-align: center;"><div style="text-align: left;"><br />
</div></div><br />
"Como eu posso te dizer? É difícil. Tudo é sempre muito difícil pra mim. E pra piorar eu sou pessimista, perdi a fé nos dias, as músicas entram dentro de mim, me perfuram, eu não sei, sinto nas veias toda a tristeza como um aviso prévio de toda a confusão que virá. Porque ela sempre virá, você sabia disso, meu amor? Você já sentiu isso? Não interessa se acordei bem, se respiro normalmente ou se tive um sonho perverso na noite anterior, não importa o calendário, o rádio desligado encima da geladeira ou a porta que eu esqueço de trancar. As coisas simplesmente acontecem muito depressa e eu não tenho forças, ou até tenho mais não quero mover um só palmo para impedir que tudo isso aconteça. Eu acho que no fundo, eu não passo de uma expectadora, sabe? Da vida, das relações, dos sentidos apurados, dos amores que eu deixei passar. Acho que eu não quero ser feliz. É isso."<br />
<br />
"O que te acomete é a suprema falta das ilusões. O que pode ser explicado também por Sartre na página 53 daquele livro que te falei, em relações interpessoais do capítulo quatro: As essências. Ou então por Freud, minha querida, digo: leia Lacan. Você notará também explicações convincentes a cerca dos teus traumas antigos. Como quando você apanhava quando criança e hoje gosta de apanhar na cama."<br />
<br />
"Uma palavra pra você, querido, Niet-zsche."<br />
<br />
"Tudo bem. E o café?"<br />
<br />
"Ficou amargo. Não vale a pena."<br />
<br />
"Porque você acordou hoje tão mal humorada?"<br />
<br />
"Sei lá, mistura de tpm com finzinho de domingo. Eu fico assim mesmo."<br />
<br />
"Você já decidiu o vestido?"<br />
<br />
"Já."<br />
<br />
"Que horas?"<br />
<br />
"Oito. Você vai chegar a tempo?"<br />
<br />
"Eu já te decepcionei alguma vez?"<br />
<br />
"Várias vezes.<br />
<br />
"Quando?"<br />
<br />
"Quando você não adivinha o que eu penso. Ou quando você dorme primeiro e eu fico sozinha, fico com<br />
medo."<br />
<br />
"Não é minha culpa. Você, às vezes, pode ser muito injusta."<br />
<br />
"Eu sou exigente com tudo, você sabe disso. A vida também me exige em tudo. E além disso... O amor tinha que ser capaz de ler mentes, você não acha?"<br />
<br />
"Eu não sei. Acho que sim."<br />
<br />
"Eu quero dizer, como uma sinalização em que você teria a certeza de que há qualquer conexão ou sentimento. É terrível todo esse acaso, todos esses amores irrelevantes-indiferentes. A vida é tão curta . Porque todo o perigo, toda a atenção em alerta se eu posso ser feliz desde ontem?"<br />
<br />
"E como você reconheceria as pessoas certas se não se encontra-se antes com todas as pessoas erradas?"<br />
<br />
"Isso é piegas demais pro meu humor prejudicado, Luíz. Fica para a biblía ou para o sermão de hoje à noite no casamento."<br />
<br />
"Que horas mesmo?"<br />
<br />
"Oito."<br />
<br />
Na igreja decorada de salmão e branco, rosas amareladas, espelhos no chão e vitrais coloridos, eu não reconheço ninguém. Apenas a noiva que também é funcionária do hotel cinco estrelas em que eu trabalho e que usava pérolas todos os dias.<br />
<br />
"Como ela se chama mesmo?"<br />
<br />
"Catarina."<br />
<br />
"E ele?"<br />
<br />
"Não lembro. Talvez seja Ricardo."<br />
<br />
"Você acha que demora?"<br />
<br />
"Acho sim. Porque agora, a esta altura do campeonato, toda essa aversão à casamentos? Seus pais são separados?"<br />
<br />
"Nenhum trauma dessa vez. Apenas acho entediante toda essa formalidade e expectativa. É como marcar a primeira vez de uma garota em um final de semana livre e encher a cama de flores para descobrir depois que ela ainda não tem seios formados. Eu não gosto disso. O que aconteceu com as histórias em que as pessoas fugiam para se casarem escondidos?"<br />
<br />
"Tá falando de Las Vegas?"<br />
<br />
"Tô falando de espontâneidade. O mundo não tem mais isso ou nunca teve."<br />
<br />
Catarina seria a única que dançaria sozinha no meio do salão, como a estrela mais bonita da noite. Vestiria branco, eu imaginei, e provavelmente um colar de pérolas. Carregava as flores no colo, caminhava devagar como no ensaio do dia anterior, eu pensei. O que era realmente estranho é que ela não sorria. Não olhava para os lados como em outros casamentos. Olhava o chão, as flores, os detalhes do vestido, as mãos. Foi nessa época que eu devo ter compreendido também sobre compaixão. Por trás de todo ser humano fodido, mesquinho e maldoso havia uma história triste. Eu sentia pena por todos eles, inclusive por mim.<br />
Quando Catarina chegou ao altar não olhou para Ricardo ou Carlos, não me lembro o nome, mas o fato é que ela não sorriu hora alguma. E isso hnão passou despercebido.<br />
<br />
"Ela vai vomitar?"<br />
<br />
"Acho mais fácil ela sair correndo."<br />
<br />
"Isso é terrível. Eu quero chorar por ela."<br />
<br />
"Você não pode ser tão sensível assim."<br />
<br />
"Eu sou sensitiva. É diferente. E além do mais, você vê todo esse silêncio eminente? Isso é assustador. Parece que não há como voltar atrás, como não ter opções depois de rezar a Deus e pedir para morrer. Eu quero dizer, depois disso você acha que não tem outro jeito e que você realmente vai morrer a qualquer momento."<br />
<br />
"Você acha que eles podem nos escutar?"<br />
<br />
"Acho que tem sempre alguém prestando atenção."<br />
<br />
"Sabia que eles se conheceram no mesmo dia que a gente?"<br />
<br />
"Um ano, então."<br />
<br />
"Sim, sim."<br />
<br />
"Como ele a pediu em casamento?"<br />
<br />
"Acho que foi no restaurante prefirido dela, no dia do aniversário dele."<br />
<br />
"No champagne?"<br />
<br />
"Na sobremesa."<br />
<br />
"Teve aplausos?" Dessa vez ela riu.<br />
<br />
"Aposto que sim."<br />
<br />
"Parece alguma cena de uma série norteamericana antiga."<br />
<br />
"Talvez seja por isso mesmo."<br />
<br />
"Meus irmãos, estamos aqui para selar a união magnífica deste homem apaixonado pela belíssima Catarina Helena. O casamento é a forma mais rápida e eficiente de se aproximar de Deus e rever todos os conceitos pregados por Cristo. O amor, depois de todo o sofrimento ainda é o mais verdadeiro dos sentimentos quando o homem simplesmente percebe que não pode ser alguém se não tiver uma mulher ao lado."<br />
<br />
"Em Lucas, versículo quinze, Deus vem nos dizer mais uma vez sobre a necessidade humana em ter uma companhia em noites de turbulência. Você Catarina, é quem vai segurar a mão de seu homem quando ele estiver em noites de turbulência. E para tudo isso é necessário a paciência trabalhada por todos os dias de nossas vidas. A concessão por sua vez é a mais importante das causas em que temos que trabalhar, como a chama da paixão que nunca pode deixar-se apagar..."<br />
<br />
"Sabe, ainda há beleza nisso tudo."<br />
<br />
"Talvez, querido. Acho que no fim, eu apenas não gosto de dar o braço a torcer."<br />
<br />
"Você está muito bonita, hoje."<br />
<br />
"Hoje."<br />
<br />
"Você acha que a eternidade acaba em algum lugar?"<br />
<br />
"Tem que acabar, não é mesmo?<br />
<br />
"Eu penso assim: em algum lugar, haverá sempre alguma barreira."<br />
<br />
"Mas isso também pode ser superado e depois disso pode haver mais duas eternidades, depois outros<br />
muros, outras paradas. A eternidade da eternidade."<br />
<br />
"A eternidade da eternidade. Bonito."<br />
<br />
"A eternidade, meus filhos, está apenas ao lado de Deus. Por isso na instituição que será consagrada agora, estarão todas as promessas declaradas perante todos os juízes do céu e da terra. Estará também todo o comprometimento e amor laçados. Não pode haver arrependimento no casamento, meus queridos filhos. O que Deus une, nenhum homem é capaz de separar."<br />
<br />
"Você reparou que ela não tirou o véu?"<br />
<br />
"Reparei."<br />
<br />
"Acha que ela está sendo obrigada?"<br />
<br />
"Ela pode estar grávida também."<br />
<br />
"E o pai obrigou?"<br />
<br />
"Ou a consciência, não é mesmo? Ela não teve mãe. Sabe bem a importância disso tudo para a saúde de uma<br />
criança."<br />
<br />
"Psicologia barata, Luís. Perdi minha mãe aos oito anos e nem por isso me casaria por medo de barriga."<br />
<br />
"Você é ariana, é diferente. Não faria nada que tivesse "obrigação" no meio de uma frase."<br />
<br />
"Ele disse sim. Você acha que ela vai dizer também?"<br />
<br />
"Catarina Helena de França, você aceita este homem, como seu legítimo esposo, enfrente a toda a sua família e perante Deus nosso Senhor, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença por todos os dias de sua vida?"<br />
<br />
"Aceito."<br />
<br />
"Então pelo poder concedido a mim, eu vos declaro marido e mulher. Podem aplaudir os recém-casados."<br />
<br />
A igreja toda se levantou em lágrimas e assobios. Eu reconheci a sonata que tocou enquanto os noivos viraram-se para a platéia e pareceram segurar as mãos pela primeira vez.<br />
Não haveria festa porque ela tinha optado por um transatlântico pelo Mediterrâneo. Ela usava as mesmas pérolas que usava todos os dias no Grand Hotel, eu pude perceber quando ela passou ao meu lado. O véu continuava abaixado, as flores à tiracolo, os sapatos brancos que apareciam a cada vez que o vestido dançava para trás e ela usava branco. Branco, eu pensei, só ela pode estar de branco. Isso definitivamente é alguma coisa.<br />
Na saída, havia balões vermelhos por todos os lados, nos para-brisas, no retrovisor, em galhos de arvóres. Ela não segurava minha mão. Eu me recordo também que houve fogos de artifício e que nós dois assistimos na esquina da igreja, dentro do primeiro carro que eu comprei. Tinha banco de couro, custou umas oitocentas pratas e nós ouvíamos músicas pelo toca-fitas. Eu era metido em filosofia e acordos federais, você tinha o cabelo grande, ruivo e era ariana. Eu não sabia ler mentes, você não consultava horóscopo, não acreditava em coincidências e tinha medo do pai. Eu tinha vinte e poucos, você também. Naquela noite houve confeitos, vestidos longos, uma transa rápida depois do banho e depois outras muitas análises sobre cada falta humana e nossas angustias, que eu ainda arrisco dizer que são as mesmas.<br />
Catarina se separou seis meses depois. Incompatibilidade de gênios, ela alegou para o juíz. E o casamento não tinha sido consumado. O marido chorava, chorava envergonhado pedindo um pouco mais de tempo.<br />
Que a reconquistaria. Que cumpriria seu papel de homem.<br />
<br />
"Mas eu não te amo mais."<br />
<br />
"Nunca me amou?"<br />
<br />
"Amei."<br />
<br />
"E quando parou de me amar."<br />
<br />
"Quando eu me tornei sua. Quando eu me tornei sua e nunca fui sua realmente. Eu fiquei vagando por aí. Não era de ninguém. Eu não era ninguém depois disso."<br />
<br />
Você me deixou quase na mesma época pelos quases mesmos motivos.<br />
<br />
"A gente não lê a mente um do outro. Você sabe. E tem Paris, tem a Áustria, eu nunca vi um Munch de<br />
perto."<br />
<br />
"Qual vai ser o primeiro quadro?"<br />
<br />
"O beijo."<br />
<br />
"Por causa do azul?"<br />
<br />
"Também. Mas ela não tem rosto. Já percebeu?"<br />
<br />
"Não. Mas agora eu posso ver."<br />
<br />
"O que você pode ver?"<br />
<br />
"Tudo. Inclusive você."<br />
<br />
"Às vezes eu esqueço que você também escreve."<br />
<br />
"Como você pode esquecer isso?"<br />
<br />
"Do mesmo jeito que você também esquece. Como agora eu finjo que esqueço. Eu me esforço muito em fingir que eu não sei. Mas eu sei. Eu sei durante quase todo o tempo. "<br />
-<br />
<br />
"Continuo bonita?"<br />
<br />
"Mais do que antes."<br />
<br />
"Isso é bom?"<br />
<br />
"Acho que não para mim."<br />
<br />
"Você me deseja sorte?"<br />
<br />
"Sempre?"<br />
<br />
"Como era aquela frase mesmo, querido?"<br />
<br />
"A eternidade da eternidade."<br />
<br />
"Isso. Ainda continua bonito."<br />
<br />
"Algumas coisas sempre serão bonitas."<br />
<br />
"Como eu?"<br />
<br />
"Como você e suas sardas quando o sol vermelho reflete em seu rosto." Ela caminhou até a porta.<br />
<br />
"Luís, eu queria ser Catarina também. Ela não tem rosto. Mas no altar, ela disse sim."<br />
<br />
Fechou a porta. Eu fiquei pelo sofá lendo Miller, trópico de câncer, eu pensei em Março, quase perto de Abril, é áries. Duas horas depois um avião cortou o teto da minha casa.Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-42342501434036362932012-06-24T18:42:00.002-07:002012-07-08T16:24:37.043-07:00<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="http://2.bp.blogspot.com/-fdx3Wxq3_U8/T_oWrb_zP2I/AAAAAAAAANc/ZGDjURLk4U8/s1600/tumblr_lnc8enWvPM1qb91u6o1_500_large.png" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="480" src="http://2.bp.blogspot.com/-fdx3Wxq3_U8/T_oWrb_zP2I/AAAAAAAAANc/ZGDjURLk4U8/s640/tumblr_lnc8enWvPM1qb91u6o1_500_large.png" width="640" /></a></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"></div><div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"></div>Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-70733481379991435702012-06-24T18:40:00.002-07:002012-06-24T18:40:34.655-07:00Nossas angústias de Hollywood É imprescindível que você saiba e não se esqueça nunca que eu não fui sempre assim: cínica, sarcástiga e egoísta. Neurótica aconteceu no “entre”, durante tudo que eu era e tudo que eu me tornei.<br />
<br />
A questão Bárbara, é que às vezes o papel não é suficiente. Eu sei que eu sou um pouco exigente com as pessoas, com a verdade, com a minha patologia, com o meu amor que é meio controlador e cheio de rédeas. Eu sei também que eu sou megalomaníaca e mesquinha, pensando sempre em mim, no meu escudo, nas minhas vontades cheias de quero-quero e bate-o-pé.<br />
<br />
Eu confesso que sou exigente com tudo e escrever não é uma excessão. Também não funciona, também não tira o nó da garganta, também não cura a vontade de entrega, de dormir um sono eterno ou me atirar do vigésimo quinto andar só porque o filme é de drama e hoje é domingo à noite. Não me entenda mal, eu fico bem sozinha, o problema é que eu ainda não aprendi a lidar com a solidão. Essas coisas triviais e que nunca se tornam clichês, a gente enlouquece com coisas tão bestas e simples. Eu continuo muito humana.<br />
<br />
O que eu quero dizer é que nem os papéis, nem os braços, nem mesmo as conexões e a compreensão, nada, nunca vai ser o suficiente. Inclusive eu, você e o amor em si. Mesmo que seja assim: intenso e quente, feito seus cigarros doces Hollywood.<br />
<br />
A gente chora dentro de um abraço, às oito da manhã e finge que sorri, esquece de tudo, tem outros papos. Você até paquera alguém em um bar decadente perto da faculdade. E eu fico assim, só de longe, me sentindo muito impotente e cheia de medo.<br />
<br />
Eu sei que eu sou medrosa pra caralho e exagero quase sempre, mas é que às vezes Bárbara, assistir o filme repetidamente dói. Dói como da primeira vez.<br />
<br />
É como eu te disse, ainda nesta tarde, nas nossas conversas pelas beirada do superficial, quando na verdade somos mais profundos do que supomos: eu só posso assistir.<br />
<br />
A vida é assim mesmo, meio boca livre, meio trágica, uma putaria sem fim de esconde-esconde, dramas familiares e preconceitos hereditários. Porque no fim, nem todo mundo é capaz de amar. E você sabe, teve esse puto azar de nascer em um janeiro de capricórnio, de se entregar, de não ter minhas rédeas, de se jogar de penhascos, de supostamente ter essa obrigação em conquistar tudo e todos. E de repente te negam amor, te viram as costas, existem traições ainda. E eu só consigo pensar, que medo, que medo filho-da-puta por você.<br />
<br />
E novamente essa solidão que me empurraram e não sei lidar. Também não sei viver. É preciso dicionário, mais vinte anos, escola-para-vida, traduções e muita compreensão. Em contrapartida nunca fui boa em aceitar esses sentimentos. Quero outra coisa. Isso também não serve. Também não me acalma. Não conforta. Não sei ser leve e não quero esquecer. Entendeu? Eu não sei andar sem olhar para trás.<br />
<br />
Seu amor, eu imagino, deve morar na zona sul da capital. E você tem que enganar a vida pelas esquinas de um bar ou de uma festa de fim de ano. Só porque a história tem seus horários, só porque a merda da mamãe deve ser ariana e controladora como eu. Só porque o mundo ainda não está preparado para a sua intensidade. Ao mesmo tempo eu não consigo entender. Parece que só é real enquanto dói. Parece que só vale a pena se alguém chegar perto o suficiente para me partir em dois.<br />
<br />
Minha querida amiga, continuo amadora em tudo e as palavras ainda me parecem pequenas demais. Pequenas perto de toda aquela energia e proteção que você merecia - merece - e que eu quero te dar. A minha única sacada na vida foi ter entendido o que era necessário para amar. Também não esqueço do vinho, dos cigarros, da solidão que foi fundamental para aceitar as esperas. Em contrapartida, cortei muita gente da minha vida. E quando eu quero, hoje eu arrumo as malas.<br />
<br />
Porque na verdade nós não passamos de vítimas. Nós somos vítimas de nossos próprios sonhos. E não há nada que possamos fazer. Continuamos pequenos, insignificantes diante de tantas escolhas, tantas possibilidades, tanta gente interessante e melhor do que nós duas.<br />
<br />
É como eu me encontro: de onde é que nós tiramos força e conseguimos escolher os caminhos, a enfrentar os pais, a dizer adeus? Quando e com que idade eu ou você pegamos o lápis e nos decidimos pelo caminho de escrever que não tem volta, cuspimos diante de tanta hipocrisia, tanta crueldade, tanta caretice, meu Deus. Como é que a gente foge disso tudo e encontra Paris no meio dessa cidade caótica de sol&chuva e que tem mais de um milhão de habitantes e ainda assim, todo mundo se conhece?<br />
<br />
Como é que a gente se esconde? Como é que a gente chora sem ter medo de ser interrogado? Eu também não sei. Meu peito parece ficar azul nesses momentos de iluminação. Eu assisto passiva essas dores de parto, de ausências, de amores predestinados e de gente horrível que não tem motivo nenhum para se lamentar. Não aprenderam a chorar na vida, no mínimo.<br />
<br />
Aí eu debocho. Tiro sarro com juventude burra, garotas iludidas, Caio Fernando Abreu e corações perdidos pelo universo. Apesar de tudo compreendo muito mais o sofrimento e a compaixão. E o nosso papel em sofrer e esperar. Ao mesmo tempo, me sinto mais amarga. Mais esperta. Mais conectada com a mulher que um dia eu devo ser.<br />
<br />
Eu penso: Meu Deus, já sofri tudo que deveria sofrer para me tornar enfim, uma mulher madura e experiente? E eu quase escuto o ruído das asas de um pássaro. Ou até mesmo vejo um, descendo em queda livre pelo céu quadrado na minha janela. É o que tritura meus ossos e me faz gemer de dor mais uma vez: enquanto o meu céu for o quadrado da minha janela, ainda há pelo que sofrer.<br />
<br />
E sei: não sou livre, meu Deus. Eu nunca serei.<br />
<br />
Só sei que um dia a gente se encontra, descobre, compreende a vida. Ou encontra as chaves. Repito que eu não sei. Mas você, eu desconfio que acaba se jogando do meu vigésimo quinto andar: não porque é domingo, o filme é triste ou você não suporta a dor.<br />
<br />
Eu suspeito que você já nasceu sabendo voar.Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-55365249521236360072012-06-24T18:39:00.002-07:002012-06-24T18:39:22.952-07:00Entre Bukowski e Rodrigues O rádio ainda ligado me dizia melodramático, às duas da manhã: “eu volto, volto para você”. E duas garrafas do pior uísque me juravam uma ressaca pela manhã. Mas eu não me sentia mal, ainda haviam cinco cigarros no bolso e a barba por fazer. E é engraçado porque o jornal atirado enfrente ao cabideiro, aberto na página dois dos classificados, com círculos em canetinhas guaxes e neons, é sempre do que eu mais me lembro.<br />
Na mesinha, um abajur classudo iluminava a madeira branca, o bico do tapete que era creme e o copo de água ao lado. Um tom baixo talvez em sépia me remetia coisas como um bar exclusivo e discreto na zona sul da capital, onde banqueiros, executivos, magnatas, sócios majoritários, milionários falidos e falsetes podiam compartilhar suas misérias e pecados silenciosamente ao som baixo do blues.<br />
Nessa mesma cena há um cantor no tablado corrido, de gravata, terno preto e paletó. Um copo também, remexido a cada dois minutos em companhia do microfone. Garçons que especulavam em círculos pelo salão esperando pelo braço que lhe fariam abaixar as cabeças e depois uma pequena caminhada, seguido prontamente de uma frase côrtes, algo como “Deseja algo, senhor?” e então “Sim, uma vodca com suco de laranja.” Ou talvez “Não, nada. Já não quero mais nada.” E o meu caso era sempre o primeiro quando o copo nada mais fazia do que dançar junto comigo o que eu não podia chorar com os outros. E também por isso, talvez, eu não me permitia sair antes de esvaziar dois litros e meio à minha frente. <br />
E eu também me lembro do saxofone, de festas de gala, vestidos bordados em pedraria e sedas esvoaçantes com cheiro de jasmins, de puteiros cinco estrelas em hotéis luxuosos no centro da cidade ou ainda sonhos mirabolantes de adolescentes quando descobrem os seios de uma mulher. Logo depois eu vejo as horas, são seis e meia da tarde e ainda há sol lá fora, eu confirmo entre as cortinas. Sua bunda descoberta desenhando pelo lençol branco de cetim, o seu corpo deslumbrante. Aquelas tuas malditas curvas de um autódromo bem cuidado que me emocionavam sempre pela tarde, depois de uma foda gostosa contigo quando dormíamos sem lembrarmos sequer de nossos nomes. Esses eram os momentos em que eu me tornava mais uma vez, um ninguém. Um filho-da-puta rancoroso e mesquinho que eu esquecia pelas gavetas ou entre as suas coxas, eu não sei. Mas o fato primordial era que esses dias eram sábados quinzenais quando eu ao invés de seguir reto pela Paranaíba, contornava a Praça da Morte e descia pela Tocantins. Estacionava, abaixava o vidro, te jogava um beijinho, você do outro lado da rua dava tchau para as amigas, descia a calçada e encostava na porta do carro. Você dizia “Pensei que não vinha hoje.” E eu digo algo como “Eu não me esqueceria de você, meu bem.” Depois você contornava o carro por trás, enquanto me olhava pelo canto dos olhos pelo retrovisor lateral, trocado há dois dias. Abria a porta do carro, escorregava pelo banco e me mostrava a meia calça preta de renda que ela havia comprado no dia. Dois beijos na boca, um suspiro longo e a primeira marcha engatada.<br />
<br />
- Diz meu nome, Carlos?<br />
<br />
- Porquê sempre isso?<br />
<br />
- Eu não sei. É que meu nome fica mais bonito na sua boca. Você fala de um jeito diferente, sabe? Não é igual a nada no mundo.<br />
<br />
E antes Carlos Gardel em fita cassete, um boquete no sinal vermelho saída da cidade, um jantar no restaurante do posto de gasolina. Eu comia costeletas de porco malpassadas e um vinho tinto. Ela comia saladas caesars e muitas, muitas garrafinhas de água com gás, importadas da Europa. Um cheque especial na saída, um comprimento ao maitre conhecido e então a estrada, a sensação de viagem distante que nos impressionava a cada quilômetro.<br />
Na recepção haviam muitas flores, lustres e tapetes indianos, quadros todos em tons de vermelho que me davam aquela sensação de leste europeu e sacanagem.<br />
<br />
- Qual quarto, senhor? E então ela respondia por mim.<br />
<br />
- 501<br />
<br />
Ela sempre escolhia os quartos, essa era a verdade. Ora por despeito por seu sexo frágil ora uma sequência aleatória e totalmente ambiciosa. “É simples, eu quero estar em todos os lugares.” Ela me explicava enquanto abria suas cartas na mesa de poker que fica no centro da suíte.<br />
<br />
- Uma carta, Rodrigues.<br />
<br />
- Você sabe que não gosto disso.<br />
<br />
- Então faça por mim.<br />
<br />
- A Torre.<br />
<br />
- Isso não é bom. Isso significa um relacionamento tumultuado, caminhando para a ruptura. O consulente esta se sabotando para não se envolver emocionalmente, fugindo de qualquer tipo de compromisso que para ele é uma prisão.<br />
<br />
- Que grande bobagem, Carmem, isso não é nada mais que uma trapaça.<br />
<br />
- Você joga dados, eu jogo cartas. O que há de tão diferente nisso?<br />
<br />
- Muitas coisas.<br />
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- Eu não vejo nenhuma.<br />
<br />
(Pausa)<br />
<br />
- Você ainda escreve?<br />
<br />
- Claro. Escrever continua sendo a minha maior vingança, Carlos. Eu apenas sou sutil.<br />
<br />
E isso era o suficiente para eu me calar, porque a realidade é que ela sempre fora mais inteligente do que eu sempre supus. Seja por ignorância ou preconceitos que só morreriam junto comigo. Eu pensava, há certos preconceitos fundamentais para a alma de um homem. O mundo também exigia que eu fosse um filho da puta.<br />
Mais tarde no canal de esportes e CNN, você saía de sutiã e uma calcinha de renda preta, abaixava as luzes do quarto, eu ligava a do abajur. O rádio na cama, ficava no blues. 180 FM, na companhia das madrugadas, rodava Frank Sinatra, Carlos Gardel e Elvis Presley. As cortinas com blecautes que eram acionadas por um controle remoto. Eu via apenas seu corpo pelo espelho e o reflexo da imitação de um Modigliani na parede de trás.<br />
<br />
- Eu queria ser um blu-e.<br />
<br />
- Queria ser uma música ou uma cor? - eu perguntei de um jeito esnobe, rindo da sua dificuldade quando tentava explicar qualquer coisa sobre si mesma.<br />
<br />
- Dá no mesmo, Carlos, dá no mesmo.<br />
<br />
E então seus passos de ponta de pé. Seus peitos pequenos que se escondiam dentro das minhas mãos. A sua perna de repente cheia de vida me sufocando pelo corpo. A sacanagem sussurrada ao pé do ouvido e a sua voz cínica, abafada. A boca molhada pelo meu rosto e o seu cabelo como uma leoa faminta de amor. Meu pau duro em suas costas, seus olhos fechados, insones, escondendo a dor. Nunca soube se eu gostava de você ou da sua dor infinita que eu queria que fosse minha. Ou pelo menos repartida. Partida.<br />
De repente você ia morrendo, ficava passiva feito um bicho definhando de fome, eu metia fundo, você gemia baixo. Depois deitava, chorava encima das minhas costas, me molhando com todos os teus medos baratos e profundos. Você nunca seria minha e eu nunca seria seu: essa era a única certeza clara e concreta. Dois escravos da solidão devastadora. A puta mais bonita da cidade. A mais triste também. A que sabia etiqueta, se interessava por concertos e música clássica. Que pedia saladas de escargots e não bebia vinho, mas sim vodca.<br />
Mas eu confesso, confesso que quando ela não chorava eu não gostava do sexo, de repente não gostava mais daquela garota. Eu socava a bancada da pia de granito, eu pensava, porra, porque você fala baixo assim? Eu preciso que você grite junto comigo. Que seja aquele exagero. Preciso que depois você me conte, entre risadas, aquelas histórias de criança quando você ainda era inocente ou então aqueles teus traumas eternos e de como o seu pai fodeu com todo o seu futuro.<br />
Sinto falta de trepar contigo e ver teus olhos mortos de repente olhando o teto e então seus olhos petrificados, olhando dentro de mim. Entre as contagens regressivas para o fim do mundo e as cartas de tarot cigano, eu me divertia com você. Eu então te penetrava mais fundo, por isso também segurava seu rosto e lhe agarrava o cabelo. Estávamos entre baladas e sábados quinzenais fingindo que podíamos pertencer por alguns instantes.<br />
Só você sabe que eu ainda sou capaz de sentir, eu pensava. Eu só deixo você me revirar também.<br />
Eu fumava um cigarro. Você fingia que dormia. O rádio melodramático, ainda me parecia dizer “Eu volto, volto para você.”<br />
Então eu saía do apartamento, fechava a porta com cuidado, descia pelas escadas, deixava o seu almoço e o táxi pago.<br />
Eu não te veria nunca mais depois desse dia. O rádio, eu lembro que deixei ligado. O abajur também. Das luzes eu não me lembro mais, parecia sempre noite com aquelas cortinas fechadas.<br />
Anos mais tarde, eu estava em Bancoc ou talvez na Espanha, recebi um fax contando que Carmem estava morta e eu era a única pessoa relacionado a ela na lista de emergência. Tinha morrido em um acidente de carro, na avenida Atlântica, esquina da minha casa, por uma complicação no pulmão esquerdo. Os cigarros, eu pensei, ela tinha cheiro de cigarro.<br />
<br />
Nunca paguei por uma foda com Carmem. Acho que isso e pelo menos isso, eu poderia chamar de amor. E nunca poderia duvidar.Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-18994934194402567592012-06-17T17:28:00.001-07:002012-06-17T17:28:45.930-07:00<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="http://2.bp.blogspot.com/-BrjmkZbr9cY/T952MJ32nHI/AAAAAAAAAJ8/rprxa9oulA0/s1600/tumblr_lauectmip11qahlsco1_500_large.png" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="448" src="http://2.bp.blogspot.com/-BrjmkZbr9cY/T952MJ32nHI/AAAAAAAAAJ8/rprxa9oulA0/s640/tumblr_lauectmip11qahlsco1_500_large.png" width="640" /></a></div>Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-81814702055264106932012-06-04T14:29:00.000-07:002012-06-04T14:29:18.811-07:00<div style="font-family: 'Lucida Grande', Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: 13px; line-height: 18px;"><i>"Enquanto todos praguejavam contra o frio, eu fiz a cama na varanda".</i></div><div style="font-family: 'Lucida Grande', Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: 13px; line-height: 18px;"><br />
</div><div style="font-family: 'Lucida Grande', Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: 13px; line-height: 18px;"><b>Raul Seixas</b></div>Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-5916632313889476822012-06-04T14:15:00.001-07:002012-06-04T14:15:03.501-07:00<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="http://2.bp.blogspot.com/-K_IIciCH4V4/T80lToUPjRI/AAAAAAAAAJw/69uAG5YWNQI/s1600/tumblr_lra15dSect1qhdxzoo1_500.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="500" src="http://2.bp.blogspot.com/-K_IIciCH4V4/T80lToUPjRI/AAAAAAAAAJw/69uAG5YWNQI/s640/tumblr_lra15dSect1qhdxzoo1_500.jpg" width="640" /></a></div>Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-22275288841353712532012-06-04T14:13:00.002-07:002012-06-14T11:06:50.390-07:00No centro do fim do mundo, na praça Roosevelt<div>Primeiro: </div><div><br />
</div><div>Nós dois numa banheira, na bancada da janela de cocóras no assoalho de madeira, você nua e crua, eu purificado. Seu cabelo em minha boca, sua nuca no meu peito, sua bunda e seus seios, toda a minha devoção em seu pescoço, minha barriga enrolada em seus cabelos.</div><div><br />
</div><div>Rolling Stones por toda a casa. Discos de ouro, discos quebrados, discos-voadores e satélites.</div><div><br />
</div><div>Você, nua e linda se pintando de vermelho, no tempo que marca a nossa história. 1980 por todos os calendários e constatações, o mar do tamanho da minha janela. </div><div><br />
</div><div>Descemos as escadas contando os números pares, as lajotas de pedra e granito. A areia como estrelas-do-mar se misturando com nossos dedos. E toda a visão panôramica do infinito, do pós-oceano, dos vinte anos que se passaram sem você.</div><div><br />
</div><div>-</div><div><br />
</div><div>Estive por Paris, por Mônaco em uma madrugada virada-de-ano. Vi fogos de artifícios, champanhe, explosões, estrelas e noz moscada. Vi também sua foto pendurada na parede. Os cabelos vermelhos, a pinta indecente no canto -segredo - da boca, um pouco antes da curva que lambe o meu rosto e o cheiro é de sal.</div><div><br />
</div><div>Sento na rede de tramas azuis. Azul-anil, azul-maravilha, azul-escuro e flores por todos os lados. </div><div><br />
</div><div>A coca é diet, as batatas chips ainda no centro da mesa de vidro. E todo o seu cheiro pela casa. Seus cabelos dissimulados varrendo em ondas todas as paredes da casa. E as memórias de como era foder você no escritório, no sofá da sala, na rede de tramas azuis.</div><div><br />
</div><div>Mais ainda em Paris, no sonho louco de 1930, de circo de aberrações, no centro da luz do mundo, no topo da Torre Eiffel: eu desejava abssinto, Picasso, Modigliani e prostitutas nas esquinas de Montmartre.</div><div><br />
</div><div>Mas era virada de século, existem máquinas e aviões. Ainda há mendigos, prostitutas, cabarés, máquinas de escrever e gente solitária. No metrô, a luz verde em neon, aumentou a minha melancolia. Me senti da mesma cor, verde, azul também. Fase azul de Picasso ou a luz nos olhos de Jeanne. </div><div><br />
</div><div>O cigarro apaga. Eu insisto em acender outro. Ainda bebo muito uisque, trepo pensando em você e cheiro uma carreira pela noite.</div><div><br />
</div><div>Nunca desejei nada, além de você.</div><div><br />
</div><div>-</div><div><br />
</div><div>Depois: </div><div><br />
</div><div>Ainda estou naquela fase de querer ser conhecido. Ainda desejo a glória, todas aquelas explosões solares e as promessas que fiz quando criança. </div><div><br />
</div><div>Acendo incensos coloridos, velas, improviso rezas e proteções. Peço tanto e por tanto tempo toda essa atenção que me faltou. As batidinhas nos ombros também são fundamentais, os colares, os santos, os mantras e todos os chakras alinhados. Herança de toda a Índia que já foi nossa.</div><div><br />
</div><div>Permaneço carente, o seu bicho em extinção, uma criança eterna no seu colo de mãe protetora. Ainda tenho quinze anos, meto rápido, gozo rápido, vejo desenhos animados e futebol de salão. A vontade devastadora em pensamentos: uma passagem de trem cortando a porra do estados unidos. Uma ponta a outra. Piteiras e fumaças. Os sinos que me acompanharam durante toda a vida. </div><div><br />
</div><div>Morei na Augusta, por lá eu conheci a Rita, a negra mulata do samba, a Vivi gostosinha da rua dois, a Neuza branquinha com carinha de santa, a Clara maldosa, baixinha, com carinha de França. Madamoiselle, eu dizia, e Madamoiselle era só o que sabia dizer. E é estranho falar desse tempo, de todas as mulheres que não eram você, de toda a confusão e carros vermelhos, sinais de trânsito, guardas de trânsito, as fachadas e propagandas, a missa e o coral da igreja, as escolas e crianças saltitantes pelo asfalto. Toda a vida que continuava independente da sua presença e toda a sua insignificância diante uma cidade que não parava nunca, que os postes nunca ficavam desligados, mais que era imprescíndivel para a minha normalidade diária. A vida que eu conhecia era a que existia com você. </div><div><br />
</div><div>Depois foram outras vidas. Nada do planeta Terra ou essa constelação. Tudo é alienígena e inconcebível. A começar pelos cinemas. Um lixo. Todo o comércio e lucratividade, toda a sujeira das latrinas na porra da casa de Fellini e Robert De Niro. </div><div><br />
</div><div>Já não existe James Dean e westerns decentes.</div><div><br />
</div><div>Já não se escutam as óperas de Wagner. Eu pensava, esse mundo tá fodido. Fo-di-do.<br />
Eu tinha voltado enfim, para casa.</div>Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-58287118022680042532012-04-04T07:15:00.001-07:002012-06-17T18:55:14.047-07:00E eu pensava nervosa: coragem, Ana. Coragem. Com sua voz ao fundo dizendo que Miller já havia imperado suas três mil palavras diárias.<br />
<br />
Mas são duas da manhã e meus pais dormem ao lado. Você respira pesadelos terríveis, inimagináveis na minha categoria de que não há pesadelos e todos são sonhos. Apenas sonhos, eu repito.<br />
<br />
E você cai, como se a cama fosse um precipício vertiginoso e dorme novamente.<br />
<br />
E as putas nas esquinas e os poucos bares ainda abertos e os vigias noturnos não sabem que também trabalho à noite e morro em combate todos os dias.<br />
<br />
- Você precisa escrever, Ana.<br />
<br />
- Eu sei, eu sei. Eu tento. Mas me assusto com as teclas em sangue e tenho medo dos finais e de todas as palavras que vão me consumindo ao longo das confissões.<br />
<br />
Eu quero dizer: quando isso tem fim?<br />
<br />
Quando é que o peito se cala, que eu durmo em paz, que a festa no vizinho termina, que o sol nasce e esqueço a vergonhosa tarefa que me coube?<br />
<br />
Também não divido com mais ninguém minhas dores. É tudo enganação. Não tem prêmio ou best-seller que me faça estripar todos os meus segredos mais sujos.<br />
<br />
Não tem retorno, não há cartas de resposta ou "te entendo muito bem".<br />
<br />
Apenas a vontade de fumar outro e outro cigarro. Observar o sol em chamas queimado a noite aos poucos e a sensação de imortalidade quando todos no mundo precisam descansar.<br />
<br />
Mas hoje eu te tenho nas mãos. As pernas coladas, o hálito quente em nossa respiração boca-a-boca e a prateleira fantasmagórica calando os gritos de Dostoiévski e Rubem Braga.<br />
<br />
<br />
Os postes de luz - nossas verdadeiras estrelas de chão quando o céu negro nos esquece e traga todas as nossas esperanças.-<br />
E não tenho medo. Três mil palavras guardadas às três horas da manhã. Enquanto o resto do mundo dorme, assim como você, eu escrevo.<br />
<br />
Hoje, eu escrevo.<br />
<br />
<span style="font-family: 'Lucida Grande', Verdana, Arial, Helvetica, sans-serif; font-size: x-small;"><span style="line-height: 18px;"><br />
</span></span>Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-27779172631036909422012-04-04T06:34:00.003-07:002012-04-04T07:16:33.083-07:00É categoricamente imprescindível que você saiba e não se esqueça nunca que eu não fui sempre assim: cínica, sarcastiga e egoísta. Neurótica aconteceu no “entre”, durante tudo que eu era e tudo que eu me tornei.<br />
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Aí eu rio. Tiro sarro com juventude burra, garotas iludidas, Caio Fernando Abreu e corações perdidos pelo universo. Tem que sofrer sim, tem que amar sim, tem que morrer e renascer todos os dias sim, pra rir de tudo isso hoje.<br />
<br />
E me sinto mais amarga. Mais esperta. Mais conectada com a mulher que um dia eu devo ser.<br />
<br />
Eu penso: Meu Deus, já sofri tudo que deveria sofrer pra me tornar enfim, uma mulher madura e experiente? E eu quase escuto o ruído das asas de um pássaro. Ou até mesmo vejo um, descendo em queda livre pelo céu quadrado na minha janela. E o que tritura meus ossos e me faz gemer de dor mais uma vez, sentindo no arrepio de toda a minha humanidade e compaixão é: Enquanto o meu céu for o quadrado da minha janela, ainda há pelo que sofrer.<br />
<br />
E sei: não sou livre, meu Deus. E nunca serei.Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-26697173271914346432012-04-04T06:32:00.002-07:002012-04-04T06:33:21.627-07:00<div class="post_content" id="post_content_20395565173">- Os morangos estão morrendo. - Ela disse. E o rosto tão triste, tão devastado e verdadeiramente sofrido pelos morangos que eu fingi não entender.<br />
<br />
- O quê?<br />
<br />
- Os morangos, Carlos, estão morrendo.<br />
<br />
E o rosto comido por dores inexistentes, tpm fora de época, pílulas e cigarros e amores acabados. E tudo, tudo era um motivo triste.<br />
<br />
Eu fui sensível o suficiente para entender e não debochar de sua dor. Frase proibida, escrita à lápis no nosso manual-de-vida-básica: “Nunca dizer: Essas coisas acontecem, é natural” ou “Bobagem, não fique assim”. Auto-ajuda e mantras também ficavam cuidadosamente do lado de fora de casa e sofríamos de-li-be-ra-da-men-te. Assim, dessa forma esticada e sem pressa porque “Há muito sofrimento no mundo, Carlos. E nosso papel é chorar por aqueles que não podem.”<br />
<br />
- Podemos cantar uma música fúnebre ou então rezar alguma prece. O que você acha?<br />
- Qual música?<br />
<br />
- Eu não sei. Moon River me lembra você.<br />
<br />
- Strawberry fields forever faz mais sentido.<br />
<br />
- É verdade. Mas eu só sei o refrão (…) Nós também poderíamos entrar e ouvir Frank Sinatra. Tomar vinho e fumar. Conversar sobre o mundo…<br />
<br />
- Mundo? É muito vago, Carlos. Mas eu gostaria de chá.<br />
<br />
- Qual chá?<br />
<br />
- Cidra. Porque me acalma.<br />
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E ela foi na frente. Pálida e fraca, sustentando dores universais em seus ombros pequenos. Cantarolando Nico e entrando no segundo round com suas franjas teimosas e loiras.<br />
Trazia o colo e as mãos ensanguentadas. Os pingos rubis marcando seus passos pela calçada cinza de negrito. E essa visão foi a minha profecia diante de seus olhos fundos de noites insones: esses seriam os primeiros de todos os morangos que iriam morrer. Uma cadeia vertiginosa que nunca estancaria.<br />
<br />
Assim como Clara não escapava de sangrar todo mês.<br />
<br />
- Você está muito bonita, Clara.<br />
<br />
- E cheirando morango, Carlos.<br />
<br />
- Claro. E cheirando morangos silvestres.<br />
<b><br />
</b></div>Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-91303364948480821622012-03-25T20:39:00.004-07:002012-03-25T20:43:26.044-07:00Meus medos ainda são os mesmos, baby.<br />
<br />
A solidão continua do mesmo tamanho e as fraquezas ainda são todas vencedoras invictas. Perco lutas fáceis me esquivando dos golpes com a vergonha de quem não suporta só vitórias. E a minha tristeza, baby, como fica? Como é que eu me encontro no meio de tanta felicidade? Não me reconheço, não entro em contato com o mundo, não me comunico bem, não bebo bem. Sou outra pessoa. <br />
<br />
Preciso com a urgência de uma vida, aprender a me reconhecer diante de um espelho, de fotos antigas e memórias vividas ou não. Entre um cigarro e outro escolher a máquina de escrever e a cadeira dura que me suporta. E apenas ela me suporta nessas situações. E Cat Power aparte que não sabe o quanto me sustenta entre lamentos as minhas angústias mais terríveis. Como dias em que não reluto em deitar no piso frio do banheiro e gritar meus choros na toalha que nada entende das minhas culpas de vidas passadas. <br />
<br />
Compreendo um pouco mais o caminho, mas ainda não sei jogar as cartas e os búzios. O verdadeiro problema é Saturno em Marte. E eu que não ando lendo meu horóscopo e parei de rezar. Minha culpa mesmo. De resto, ando pensando em aprender tango argentino e ver mais lutas de boxes. Mohammed Ali caminhando soturno pelo corredor da morte, segurando o seu terço de contas e gritando entre jornalistas e câmeras "I'm gonna dance, i'm gonna dance." <br />
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No meio da minha viagem alucinante entre conversas maravilhosas e instigantes com o amor ao lado, preciso dançar. Escrever, escrever, escrever e fumar menos.Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-28294279653840938742012-03-19T16:26:00.004-07:002012-03-19T16:26:48.401-07:00<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="http://1.bp.blogspot.com/-ctVltcbDcwI/T2fAqQfIF9I/AAAAAAAAAJo/h2YLsE7QUUA/s1600/black%252Cand%252Cwhite%252Cnico%252Cwomen%252Cbeauty%252Cgirl%252Cphotography-b6c176a2a072babdadac36373b3f9a1a_h_large.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="486" src="http://1.bp.blogspot.com/-ctVltcbDcwI/T2fAqQfIF9I/AAAAAAAAAJo/h2YLsE7QUUA/s640/black%252Cand%252Cwhite%252Cnico%252Cwomen%252Cbeauty%252Cgirl%252Cphotography-b6c176a2a072babdadac36373b3f9a1a_h_large.jpg" width="640" /></a></div>Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-40599298826995962652012-03-19T16:26:00.001-07:002012-03-19T16:26:11.058-07:00Eu perguntei se ele realmente havia beijado Valentina e ele disse que não. Que queria ter beijado e por isso mentiu. Disse também que a boca dela é pequena e parece um morango e que queria guardar o gosto dela em uma caixa.<br />
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Eu fingi que não tinha ouvido nada.<br />
<br />
Ele entendeu.<br />
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(...)Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-87284346694584797112012-03-19T16:23:00.002-07:002012-03-19T16:23:25.656-07:00<div class="separator" style="clear: both; text-align: center;"><a href="http://3.bp.blogspot.com/-UZM5QHoJQX4/T2e_4qgAYxI/AAAAAAAAAJg/4arxmcXueZM/s1600/tumblr_lvqtcexYh31qdic03o1_400_large.jpg" imageanchor="1" style="margin-left: 1em; margin-right: 1em;"><img border="0" height="462" src="http://3.bp.blogspot.com/-UZM5QHoJQX4/T2e_4qgAYxI/AAAAAAAAAJg/4arxmcXueZM/s640/tumblr_lvqtcexYh31qdic03o1_400_large.jpg" width="640" /></a></div>Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-57918631116794795482012-02-04T15:02:00.001-08:002012-06-17T19:00:59.574-07:00Carta 8<br />
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My little bird,<br />
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Eu menti. Eu sei que você tem essa aversidade à mentiras e que tudo te enoja, mas entende que foi isso também que te trouxe para mim. Você ama tudo que você odeia. Foi isso que aconteceu. Por eu ser a idealização de tudo que você nunca sonhou, você me quis. E eu não queria ninguém além de ti.<br />
<br />
Você sempre mereceu alguém melhor e talvez eu tenha sido muito egoísta te mantendo ao meu lado. Mas entende que ninguém nunca tinha me cuidado daquela maneira. Ninguém nunca tinha percebido minhas faltas, enquanto negava com medo que o mundo não me afetava de nenhum modo. E que eu não morria aos poucos. E que ainda era capaz de voar.<br />
<br />
Eu não me importava com nada. E de repente eu tinha que olhar por ti e ter certeza que você respirava. Você passou a ser a grande razão. E talvez foi isso que te sufocou. Você não suportava ser o meu mundo e a minha felicidade. Você não conseguia ser nada além de você.. Você sempre foi muito profunda e arrisco dizer que também não conseguia alcançar a si mesma. E carregar o meu peso, o que você fazia sem ao menos ser questionada, te afundava mais.<br />
<br />
Minha querida, eu tenho a resposta que você tanto buscava em segredo. Você era obcecada em salvar as pessoas, para não ter que se salvar. A dor também é imensidão. Eu entendo agora.<div><br />
Enquanto eu evitava suas quedas era você que me salvava em segredo. Eu menti de todas as formas, minha Eliza. Você sempre foi mais forte que eu.<br />
<br />
Foi você quem venceu.</div>Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-60207611842999969952012-02-04T14:57:00.002-08:002012-06-17T19:02:03.103-07:00Carta 7<br />
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Minha,<br />
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Passei o dia todo te revivendo e rindo da sua voz de deboche dizendo que “não tem ninguém em casa”. A secretária eletrônica também achava graça, quando em silêncio, escutávamos o sinal e logo depois alguém que atordoado nos procurava com urgência. Ou então nossos pais que não tinham notícias nossas há um mês.<br />
<br />
Nós fugíamos do mundo e ignorávamos o céu. Quem mais tinha a nossa coragem de ignorar e desdenhar o céu? Eu contornava tua boca com a ponta do dedo e sorria junto do teu sorriso. Você dizia com raiva que não sabia dançar e eu adorava seu jeito inflexível de não querer aprender. Era tudo tão simples e complexo ao mesmo tempo. Como entender, naqueles dias, que te ver passar o batom rosa chá era fundamental e importante? Que aquele nó mal feito na gravata era especial? Como voltar no tempo e gritar alto no meu ouvido para me importar mais, não deixar perder nenhum detalhe teu. Para prestar atenção. Porque eu não notei que enquanto você ria, havia uma tristeza, ali, no canto da tua boca? Porque eu não percebi que enquanto você suspirava contando estrelas, você inundava cidades? Porque que você não me contou, não me deu murros como aqueles seus e disse para não te deixar afundar assim?<br />
<br />
Eu acreditava que era pra sempre, Eliza. Você era a pessimista, não eu. Eu acreditava. E não sabia. Não sabia que, às vezes, você tinha vontade de correr e sentar em algum cais e chorar por tudo que ainda ia se perder. Por tudo que te matava por dentro aos poucos. Por todos os filmes que você precisava viver e a vida limitante e febril que te cortava. Por toda a dor do mundo que você veementemente e com entrega precisava sentir.<br />
<br />
(Todas as dores do mundo que já foram sentidas e mesmo assim ainda temos que sentir. Ainda temos tanto para escrever.)<br />
<br />
Liz, porque não repartiu tuas cicatrizes, porque eu era metade e você inteira? Porque não te segurei forte pelos pulsos, daquele jeito que você odiava.<br />
<br />
Meu amor, eu não soube ler seus sorrisos, nunca entendi seu jeito de cantar ou soprar a fumaça. Não ouvi seus gritos à noite.<br />
<br />
Tenho certeza que você nunca quis ser salva e a segurança das previsões eram reconfortantes de alguma forma. Mas ainda assim. Ainda assim, não me perdoo pela desatenção ou medo de sentir o que você abraçava forte.<br />
<br />
Eu podia ter te defendido de você mesma. Eu fui cego. Eu fui fraco. Sem você estou pior.<br />
<br />
Os dias andam azuis. E a janela continua aberta.Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3833572605170244781.post-91716061844157739142012-02-04T14:44:00.000-08:002012-02-04T14:44:55.059-08:00<div style="background-color: white; color: #444444; font-family: 'Helvetica Neue', HelveticaNeue, Helvetica, Arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19px; margin-bottom: 10px; outline-color: initial; outline-style: none; outline-width: 0px;">Carta 5</div><div style="background-color: white; color: #444444; font-family: 'Helvetica Neue', HelveticaNeue, Helvetica, Arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19px; margin-bottom: 10px; margin-top: 10px; outline-color: initial; outline-style: none; outline-width: 0px;">Eliza,</div><div style="background-color: white; color: #444444; font-family: 'Helvetica Neue', HelveticaNeue, Helvetica, Arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19px; margin-bottom: 10px; margin-top: 10px; outline-color: initial; outline-style: none; outline-width: 0px;">Acho que estou obsessivo. </div>Ana Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/16084921655208257199noreply@blogger.com0